Nosso repórter especial Gabriel Mendes conversou com a renomada escritora Janaína de Figueiredo sobre as nuances da carreira literária, o impacto dos prêmios e a importância da representatividade na literatura infantojuvenil.
Panorama da Escrita: Você já é uma escritora consagrada, já venceu alguns prêmios literários. Para você, qual é a importância desses prêmios e como isso pode ajudar na carreira de um escritor?
Janaína de Figueiredo: As premiações sempre são importantes para fortalecer essa trajetória do escritor. Para mim, as premiações são super simbólicas. Eu sou a primeira geração da família que chegou à universidade, meus pais não chegaram, meus avós, toda uma geração, várias gerações que vieram antes de mim, que queriam estar nesse espaço, nesse lugar, inclusive meu avô que queria ser escritor e não pôde. Então, eu acho que, para além de as premiações serem importantes na minha trajetória e na trajetória de qualquer escritor, elas têm alguns impactos simbólicos. No meu caso, para a minha família, isso foi muito importante, uma ruptura de uma história de falta de acesso, de luta. Então, eu acho que os prêmios representam isso.
Panorama da Escrita: E ajuda de alguma forma a trazer mais visibilidade? Qual o impacto na sua carreira?
Janaína de Figueiredo: É uma coisa incrível, né? Porque as premiações são divisores de águas na carreira de um escritor, eu tive mais convites de editoras. A gente vive numa luta antes da premiação, uma luta insana, e as premiações abriram portas.
Panorama da Escrita: Você falou até que já participou de outras FLIPs. Eu queria que você falasse como acha que esses grandes eventos literários são importantes na carreira do escritor.
Janaína de Figueiredo: Os eventos literários, as feiras, de um modo geral, são importantes por vários motivos. Primeiro, por conta dos seus leitores, do seu público. Então, primeiro, porque você tem um contato com o seu público e também ajuda a criar mais público, aumentá-lo; aumentar essa gama de leitores que o escritor precisa. Mas também acaba fortalecendo essa rede com outros escritores. Eu acho que é importante esse contato, esse diálogo com outros escritores, essas trocas. Acho que as feiras são espaços super importantes de trocas também entre escritores. A gente precisa desse momento, dessa comunidade de escritores e escritoras. A Flip, mais especificamente, me deixa um pouco chateada, e vários escritores também, porque eu acho que o espaço para a literatura infantojuvenil ainda é menor, sabe? Ainda é um espaço que fica paralelo, não é incluído nessa grande programação da Flip. Ano passado, eu fiquei bem chateada com a Flip. Eu falei: “Este ano eu não vou”, mas aqui estou, né? Porque a gente tem essa bandeira, essa vontade de estar com outros escritores, de conversar sobre literatura, de falar sobre literatura. Então, acabei vindo. Vou lançar meu novo livro aqui, que eu acho também bastante simbólico.
Panorama da Escrita: Queria saber por que você decidiu escrever para o público infantojuvenil e se você tem algum conselho para outros escritores que seguem essa mesma linha.
Janaína de Figueiredo: Eu sou antropóloga. Eu me tornei escritora muito casualmente, porque já escrevia, mas não publicava textos literários. Quando eu estava fazendo um trabalho de formação com educadores, percebi que não havia muita produção literária voltada para o tema afro-brasileiro, principalmente de uma matriz afro-brasileira, que é a Matriz Banto. Então, resolvi fazer meu primeiro livro muito voltado para esse contexto, para essa temática. Acabou que as editoras gostaram e começaram a me procurar para escrever mais. Minha escolha pelo público infantojuvenil foi por aí, porque realmente eu via que ainda havia pouca representação das religiões afro-brasileiras na literatura, das religiões afro-brasileiras na literatura para a infância e a juventude. Eu me dediquei a isso, sabe? Mas eu tenho vontade também de escrever para outros públicos.
Panorama da Escrita: Você considera que o livro em geral, mas em especial o livro infantojuvenil, é uma ferramenta de transformação social? De que forma ele pode ajudar na vida dos jovens?
Janaína de Figueiredo: Eu acho que a leitura, como diz a Yolanda Reyes, é sempre muito subterrânea, então a formação de leitores leva tempo, é complexa. Quando a criança vai entrando em contato com a leitura, na sua caminhada, no seu desenvolvimento, essa leitura vai se aconchegando nessa criança, vai criando um repertório para ela, para o jovem, um repertório que é super importante para a construção de sua identidade e para uma consciência transformadora. A gente só cria uma consciência transformadora se a gente tem esse pensamento imaginativo, utópico, e isso só acontece com a leitura, com os livros. É a literatura que permite a formação desse tipo de pensamento, um pensamento mais utópico, mais imaginativo. Então, eu acho que a literatura infantojuvenil está totalmente voltada, está vinculada à bandeira da formação de leitores. Eu acho que uma coisa não exclui a outra, uma necessita da outra. Quanto mais jovens e crianças vão se tornando leitores, com certeza vão se tornar adultos mais conscientes do seu papel transformador.
Panorama da Escrita: Você mencionou que vai lançar seu livro, quer falar um pouco sobre ele aqui?
Janaína de Figueiredo: Este é um livro que foi feito por muitas mãos. Eu escrevi junto com o Claudio Fragata, um escritor super renomado, que já está aí na estrada há bastante tempo. O nome desse livro é Sebastião. Eu sou de São Sebastião, sou caiçara. A minha cidade viveu, em fevereiro deste ano, um grande desastre, que a gente considera que é um desastre socioambiental. Foi um trauma tão grande que eu só consegui falar sobre isso através da minha escrita, junto com o Claudio, que me ajudou nesse momento. Então, Sebastião é um livro que percorre muito o que a gente chama de literatura-testemunho. É uma narrativa testemunhal, é uma narrativa que tenta falar algo que não dá pra falar, o indizível. E aí a gente conta a história da saga das comunidades caiçaras no litoral, a sua expulsão das terras, a chegada dos migrantes no litoral, a ocupação dos morros, os abismos sociais que fazem parte do litoral norte, não só do litoral, não só de São Sebastião, mas também do Brasil. Então, na verdade, é uma narrativa que fala de São Sebastião, mas de todo o Brasil. E a gente quis trazer isso para as crianças e para os jovens. Este livro está bem especial, foi feito com ilustrações do Rodrigo Mafra, projeto gráfico da Natalia Calamari e editado pela Aletria.
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