Em meio aos corredores lotados e estandes vibrantes da Bienal do Livro, um ponto de reflexão se impõe: qual é o real impacto desse grande evento literário para o mercado editorial e, principalmente, para os escritores brasileiros? Para responder a essa e outras perguntas, conversamos com Ângelo Pinto, presidente da ABRELIVROS (Associação Brasileira de Livros e Conteúdos Educacionais), que falou sobre o papel estratégico da Bienal na formação de leitores, na observação de tendências do setor e nas oportunidades que ela representa para autores e editoras de todos os portes.
Nesta entrevista exclusiva, Ângelo também compartilha a missão da ABRELIVROS, os caminhos possíveis para escritores que desejam entrar no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e comenta a simbólica presença do presidente Lula na abertura da Bienal deste ano. Um bate-papo essencial para quem escreve, publica ou simplesmente acredita no poder transformador da leitura.
Gabriel: Ângelo, acho que a primeira pergunta que eu gostaria de fazer é: qual é a sua visão sobre a importância da Bienal do Livro para o mercado como um todo? E como o nosso site é voltado para escritores, se você puder falar também um pouco sobre como enxerga a Bienal em relação ao escritor, como ele pode se beneficiar desse grande evento?
Ângelo: Bom, Gabriel, eu acho que a Bienal é um momento do ano – ou de cada Bienal – onde o livro é a principal vedete da festa. Então, por si só, já é um grande evento. Claro que a Bienal acaba atraindo aqueles que já são afeitos à leitura, mas eu acredito que sempre há espaço para conquistar novos leitores. No caso dos escritores, é uma grande oportunidade para eles, até mesmo passeando pela Bienal, observarem o mercado, entenderem como estão situados os seus projetos em relação ao que está sendo publicado. Acho que o evento também favorece muito o fomento de novos escritores.
Gabriel: Você é presidente da ABRELIVROS. Qual é o maior propósito da associação? Qual é a missão da ABRELIVROS para o escritor que ainda não conhece a entidade?
Ângelo: A ABRELIVROS é a Associação Brasileira de Livros e Conteúdos Educacionais. Ela agrega um número pequeno de editoras – são 23 ao todo – mas muito voltadas ao mercado de livros didáticos e escolares. Hoje, trabalhamos bastante com literatura, porque a literatura passou a ser incluída nos editais do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), então temos um volume expressivo de obras literárias nesse contexto. O grande propósito da ABRELIVROS é fazer uma intermediação entre o poder público e a iniciativa privada. Nos últimos três anos, temos mudado um pouco o perfil da associação, tornando-a mais presente para a sociedade civil. Por exemplo, aqui na Bienal, lançamos o terceiro anuário da ABRELIVROS, que reúne dados do PNLD, sempre com um tema principal a cada edição. Neste ano, o tema é leitura, então fez todo sentido lançá-lo na Bienal. Em linhas gerais, nossa missão é estreitar a relação entre o mercado editorial privado e o poder público, participando ativamente da construção de políticas públicas na área de livros e educação em Brasília.
Gabriel: Pensando em um escritor que já é publicado por uma pequena ou média editora, como essa editora pode entrar para a ABRELIVROS? O processo é aberto? Como funciona essa adesão?
Ângelo: A ABRELIVROS tem várias categorias de sócios. Somos uma entidade com 33 anos de existência e, ao longo do tempo, abrimos mais categorias justamente para receber editoras menores. Hoje, temos as grandes editoras que são líderes no PNLD, mas também contamos com diversas pequenas editoras – até mesmo independentes – já associadas à ABRELIVROS. Criamos um modelo de mensalidade diferenciado justamente para acomodar esses novos associados, que ainda não possuem grande porte no mercado. Ou seja, não é necessário ser uma grande editora para fazer parte da ABRELIVROS. Estamos abertos a todas as editoras, independentemente do tamanho.
Gabriel: Para um escritor que tem obras que poderiam ser utilizadas em escolas e que pretende vender para o governo, quais caminhos ele poderia seguir?
Ângelo: Hoje, os programas de governo são mais democráticos. Existe uma limitação dentro do edital do PNLD para o número de títulos que cada editora pode inscrever, justamente para permitir a participação de editoras menores e independentes. Se o escritor tem uma obra independente e possui uma pessoa jurídica, ele pode oferecer seu livro ao PNLD dentro do processo regular. O programa permite essa inclusão. A vantagem do PNLD é que, apesar de ser um processo trabalhoso e burocrático, ele oferece contrapartidas importantes. É necessário apresentar uma documentação completa, incluindo contrato do autor, contrato do ilustrador, entre outros requisitos. No entanto, um grande diferencial do PNLD é que os livros inscritos passam por uma avaliação rigorosa de especialistas. O autor recebe um laudo de avaliação, que pode aprovar ou reprovar a obra. Mesmo que o livro não seja aprovado, essa avaliação pode servir como base para melhorias e novas edições.
Gabriel: Para finalizar, tivemos a visita do presidente Lula na abertura da Bienal. Como você enxerga esse encontro? Houve algum movimento positivo nesse sentido?
Ângelo: Sem dúvida, é marcante para o mercado editorial e para a leitura no Brasil. O presidente Lula já demonstrava, desde sua campanha, um interesse grande pelos livros. Inclusive, havia aquela ideia de “mais livros, menos armas”, que reforça essa preocupação com a cultura e a educação. A presença dele na Bienal, trazendo três ou quatro ministros e assinando termos de compromisso, é muito relevante para o setor. Isso demonstra que há políticas públicas sendo desenvolvidas para fortalecer o mercado do livro e ampliar o acesso à leitura. Na mesa-redonda agora há pouco, acho que você estava lá, comentei sobre a volta do Ministério da Cultura. Isso é algo fundamental. Um país do tamanho e da importância do Brasil não pode ficar sem um Ministério da Cultura. Então, essas ações e compromissos firmados na Bienal são simbólicos, mas representam muito para o futuro da literatura e da educação no país.